sábado, 1 de outubro de 2011

Aula de 3 de outubro

Waly Salomão: ARS POÉTICA OPERAÇÃO LIMPEZA

Assi me tem repartido extremos, que não entendo...
(Sá de Miranda)

I
SAUDADE é uma palavra
Da língua portuguesa
A cujo enxurro
Sou sempre avesso
SAUDADE é uma palavra
A ser banida
Do uso corrente
Da expressão coloquial
Da assembléia constituinte
Do dicionário
Da onomástica
Do epistolário
Da inscrição tumular
Da carta geográfica
Da canção popular
Da fantasmática do corpo
Do mapa da afeição
Da praia do poema
Pra não depositar
Aluvião
Aqui
Nesta ribeira.

II
Súbito
Sub-reptícia sucurijuba
A reprimida resplandece
Se meta-formoseia
Se mata
O q parecia pau de braúna
Quiçá pedra de breu
Quiçá pedra de breu
CINTILA
Re-nova cobra rompe o ovo
Da casca velha
SIBILA

III
SAUDADE é uma palavra
O sol da idade e o sal das lágrimas

Sá de Miranda: Ledo em meus males sem cura

Ledo em meus males sem cura,
e nos descansos cansado,
querendo e sendo forçado,
ora cuidar me assegura
ora me mata cuidado.

Assi me têm repartido
extremos, que não entendo;
de toda parte corrido,
de todas desacorrido,
de nenh a me defendo.
A vida está mal segura,
eu tenho outro mor cuidade:
que mal tam bem estimado,
que nesta desaventura
me faz bem aventurado!
 


Sá de Miranda: Comigo me desavim

Comigo me desavim,
sou posto em todo perigo;
não posso viver comigo
nem posso fugir de mim.

Com dor, da gente fugia,
antes que esta assi crecesse;
agora já fugiria
de mim, se de mim pudesse.
Que meio espero ou que fim
do vão trabalho que sigo,
pois que trago a mim comigo,
tamanho imigo de mim?


Sá de Miranda: Cerra a serpente os ouvidos

Cerra a serpente os ouvidos
à voz do encantador;
eu não, e agora com dor
quero perder meus sentidos.
Os que mais sabem do mar
fogem d' ouvir as sereas;
eu não me soube guardar:
fui-vos ouvir nomear,
fiz minh' alma e vida alheas.


Sá de Miranda: Tardei, e cuido que me julgam mal

Tardei, e cuido que me julgam mal,
qu’emendo muito e qu’emendando dano,
Senhor; porqu’ hei gram medo ao mau engano
deste amor que nos temos desigual:

Todos a tudo o seu logo acham sal;
eu risco e risco, vou-me d’ano em ano:
com um dos seus olhos só vai mais ufano
Filipo, assi Sertório, assi Anibal.

Ando co’os meus papéis em diferenças;
são preceitos de Horácio – me dirão;
em al não posso, sigo-o em aparenças.

Quem muito pelejou como irá são?
Quantos ledores, tantas as sentenças;
C’um vento velas vem e velas vão.



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