Na última aula do mês teremos, como de hábito, a visita de um poeta que nos falará sobre o seu trabalho. Desta vez, o poeta convidado é André Vallias que, recentemente, lançou o livro Heine hein? Poeta dos contrários (São Paulo: Perspectiva / Goethe Institut, 2011), em que faz um admirável trabalho de tradução e apresentação do poeta Heinrich Heine. Concordo com Augusto de Campos que, na orelha do livro, declarou: "Considero este livro "um dos mais significativos projetos literários brasileiros dos últimos anos de que tenho conhecimento".
André Vallias é poeta, designer gráfico e produtor de mídia interativa. De 1987 a 1994 viveu na Alemanha, onde foi co-curador de importantes exposições de poesia experimental, entre as quais Transfutur – poesia visual da União Soviética, Brasil e países de língua alemã (1990) e p0es1e – digitale dichtkunst (1992), primeira mostra internacional de poesia feita em computador. De volta ao Brasil, tornou-se um dos mais destacados designers da web brasileira, notabilizando-se pela criação dos sites de Gilberto Gil, Caetano Veloso, Adriana Calcanhotto, Edgar Morin, entre outros. Em 2003, foi agraciado com o Prêmio Sergio Motta de Arte e Tecnologia pelo poema interativo ORATORIO. Vem publicando regularmente poemas e traduções em diversas revistas brasileiras e internacionais, como Piauí, S/N, Artéria, Et Cetera, Cacto, Roda, Cortex, Alire, Visible Language, High Quality. Contribuiu nos livros: Media Poetry: an International Anthology – Eduardo Kac (org.), Céu Acima: Para um tombeau de Haroldo de Campos – Leda Tenório da Motta (org.), Cultura Digital.Br – Rodrigo Savazoni e Sergio Cohn (org.), entre outros. Em 2007, foi co-curador da exposição POIESIS – poema entre pixel e programa (Oi Futuro, RJ) e realizou apresentações multimídia de seus poemas e traduções nos eventos Errática – Poema ao vivo (CCBB, RJ) e Poema Falado (Itáu Cultural, SP). Em 2010, apresentou-se ao lado da multi-instrumentista e performer Lica Cecato, no espetáculo Sybabelia (Oi Futuro, RJ / SESC – Pompeia, SP). É editor da revista online Errática: http://www.erratica.com.br/. Recomendo aos alunos visitarem essa revista, antes da aula.
Dois poemas de Heine traduzidos por André Vallias:
Larga as parábolas sagradas
Larga as parábolas sagradas,
Deixa as hipóteses devotas,
E põe-te em busca das respostas
Para as questões mais complicadas.
Por que se arrasta miserável
O justo carregando a cruz,
Enquanto, impune, em seu cavalo,
Desfila o ímpio de arcabuz?
De quem é a culpa? Jeová
Talvez não seja assim tão forte?
Ou será Ele o responsável
Por todo o nosso azar e sorte?
E perguntamos o porquê,
Até que súbito – afinal –
Nos calam com a pá de cal –
Isto é resposta que se dê?
Laß die heil'gen Parabolen
Laß die heil'gen Parabolen,
Laß die frommen Hypothesen -
Suche die verdammten Fragen
Ohne Umschweif uns zu lösen.
Warum schleppt sich blutend, elend,
Unter Kreuzlast der Gerechte,
Während glücklich als ein Sieger
Trabt auf hohem Roß der Schlechte?
Woran liegt die Schuld? Ist etwa
Unser Herr nicht ganz allmächtig?
Oder treibt er selbst den Unfug?
Ach, das wäre niederträchtig.
Also fragen wir beständig,
Bis man uns mit einer Handvoll
Erde endlich stopft die Mäuler -
Aber ist das eine Antwort?
Por séculos afora
Por séculos afora,
Inertes no infinito,
Estrelas se entreolham
No amor irresolvido.
A língua em que murmuram
É rica e muito bela;
Filólogo nenhum
Jamais há de entendê-la.
Porém tenho-a aprendido
Em teoria e prática:
A face em que eu orbito
Serviu-me de gramática.
Es stehen unbeweglich
Es stehen unbeweglich
Die Sterne in der Höh’,
Viel tausend Jahr’, und schauen
Sich an mit Liebesweh.
Sie sprechen eine Sprache,
Die ist so reich, so schön;
Doch keiner der Philologen
Kann diese Sprache verstehn.
Ich aber hab’ sie gelernet,
Und ich vergesse sie nicht;
Mir diente als Grammatik
Der Herzallerliebsten Gesicht.
Os poemas de Heinrich Heine traduzidos por André Vallias se encontram no seguinte livro:
HEINE, Heinrich. Heine hein? Poeta dos contrários. Introdução e tradução de André Vallias. São Paulo: Perspectiva, 2011.
Depoimento de André Vallias:
Quando iniciei o trabalho de tradução dos poemas de Heine, há exatos três anos, conhecia muito pouco sobre o poeta e sua produção intelectual, mas sabia do grande apreço que Décio Pignatari tinha por sua obra. Esta a razão, aliada à minha admiração pelo irrequieto integrante dos “tri-gênios concretistas”, de ter dedicado a ele HEINE, HEIN? – Poeta dos contrários.
Fui traduzindo aos poucos, sem qualquer pretensão de realizar uma antologia de fôlego; no máximo algo em torno do que já havia feito com a poesia de Hölderlin e Trakl – cerca de 20 poemas, intercalados com cartas –, que publiquei em versões reduzidas na revista literária Cacto. Foi, aliás, uma dessas pequenas coletâneas – a de Georg Trakl – que levou Augusto de Campos a me propor publicação na prestigiosa coleção Signos da editora Perspectiva, por ele dirigida. Quando me dei conta, porém, do enorme déficit de traduções para o português da poesia de Heine, e do desconhecimento geral de sua obra no Brasil, resolvi deixar o poeta austríaco esperando. Augusto acolheu a mudança com muito simpatia, lembrando-se da alta estima que Pound e Pignatari tinham pelo poeta judeu-alemão. O editor Jacó Guinsburg – que, por sinal, traduziu a novela O Rabi de Bacherach de Heine nos anos de 1950, depois incluída na antologia de contos e novelas de autores judeus Entre Dois Mundos (Perspectiva, 1967) – e sua companheira Gita Guinsburg não foram menos receptivos.
Mas o embrião deste livro, por incrível que pareça, foi um disco imaginário que intitulei Caderno dos Sambas, numa referência ao best-seller de Heine, o Livro das Canções. Explico-me: os primeiros poemas que verti para o português, da safra mais coloquial-irônica do poeta, me soaram tão parecidos com as letras do nosso cancioneiro popular – especialmente daqueles sambas das décadas de 1930 e 1940 –, que não pude resistir à tentação de imaginá-los com a melodia de nossos maiores compositores, na voz de nossos grandes intérpretes. Assim, “O mundo é tolo, o mundo é cego...” virou o samba “Disparate”, de Geraldo Pereira e Wilson Batista, na interpretação do próprio Geraldo; “Os teus beijinhos foram tantos...”, virou “Enfermaria” de Noel Rosa, cantado por Mário Reis; “As garrafas pelo chão...”, um samba de breque de Moreira da Silva; “Celimena” – testemunho do tempestuoso casamento do poeta – não pude confiar a ninguém menos que Lupicínio Rodrigues; e por aí fui, até completar 12 fonogramas fictícios. Depois, animado com a desenvoltura que havia adquirido na tradução dos versos de Heine e, ainda mais, com a repercussão entusiasmada dos primeiros e ilustres leitores dessa empreitada – os poetas Augusto de Campos e Age de Carvalho – resolvi encarar o desafio de proporcionar uma grande amostragem de sua obra tão original. Confesso, todavia, que não desisti ainda da ideia de ouvir o poeta de Düsseldorf na cadência do samba...
Artigo de Marcelo Coelho, na Ilustrada da Folha de São Paulo de 27/07/2011:
Heine
Para algum prêmio literário (não sei qual) já tenho forte candidato este ano.
É a grande (540 páginas) antologia dos textos do poeta alemão Heinrich Heine (1797-1856), traduzidos por André Vallias para a editora Perspectiva.
Fale-se em "cultura alemã" -e nossa reação é sacar do bolso a cuíca e o tamborim. Não há quem não tenha medo da profundidade elefantina das declamações wagnerianas, para nada dizer das sinfonias de Bruckner (mas o coitado era austríaco) e da filosofia de Kant.
É a grande (540 páginas) antologia dos textos do poeta alemão Heinrich Heine (1797-1856), traduzidos por André Vallias para a editora Perspectiva.
Fale-se em "cultura alemã" -e nossa reação é sacar do bolso a cuíca e o tamborim. Não há quem não tenha medo da profundidade elefantina das declamações wagnerianas, para nada dizer das sinfonias de Bruckner (mas o coitado era austríaco) e da filosofia de Kant.
Amigo de Chopin, de Alexandre Dumas e de Balzac, Heine -que era judeu e exilou-se em Paris- não podia estar mais longe desse estereótipo germânico.
Seu estilo é leve, fantasioso, irônico e romântico ao mesmo tempo -e Heine entendia de Carnavais. Manuel Bandeira certamente se lembrou de um soneto de 1821 ("Me passa a máscara: vou desfilar/ De plebe... Me passa, eu vou vestir-me de gentalha") em um dos poemas de seu "Carnaval", quase cem anos depois: "Quero beber! Cantar asneiras...".
Seu estilo é leve, fantasioso, irônico e romântico ao mesmo tempo -e Heine entendia de Carnavais. Manuel Bandeira certamente se lembrou de um soneto de 1821 ("Me passa a máscara: vou desfilar/ De plebe... Me passa, eu vou vestir-me de gentalha") em um dos poemas de seu "Carnaval", quase cem anos depois: "Quero beber! Cantar asneiras...".
Mas a influência de Heine sobre a literatura brasileira não fica só no autor de "Libertinagem". Já escrevi sobre o "Navio Negreiro" do autor alemão, que inspirou Castro Alves e saiu em nova tradução em português em 2009 (editora SM).
André Vallias, nas excelentes análises que acompanham sua tradução, especula se o célebre "Quadrilha", de Carlos Drummond de Andrade ("João amava Teresa que amava Raimundo") não teria seu antecessor direto num poema de Heine, musicado por Robert Schumann: "O rapaz ama uma jovem/Que deseja outro rapaz/Este de outra se enamora,/ Lá se vão ao juiz de paz"...
Muitos versos de Heine viraram canções, ou "lieder", como se diz em alemão. O sucesso que obtiveram na época (talvez o último caso de alta poesia virando best-seller na cultura europeia, segundo Walter Benjamin) provavelmente se deve ao fato de que Heine, como os compositores da MPB, sabia registrar, ao modo de um diário, os vaivéns, as nuances, as inúmeras situações do amor.
Traição, dúvida, promessa, raiva reprimida, descoberta mútua, ruptura, retorno: cabem todos os tons e todas as cores nas suas miniaturas.
Traição, dúvida, promessa, raiva reprimida, descoberta mútua, ruptura, retorno: cabem todos os tons e todas as cores nas suas miniaturas.
O principal, e o que torna a poesia de Heine mais "moderna" do que romântica, e bem "brasileira" até, está na atitude de tomar certa distância, de desarmar os próprios sentimentos.
Num poema escrito aos 24 anos, Heine começa falando arrebatadamente da Lua, com um "séquito de estrelas", e do Sol da primavera. Poucos versos depois, ele conclui: "Estrelas, lua, sol e flor,/ Dois olhos lindos e canções de amor,/Por mais que nos comovam lá no fundo,/ Não mudam uma vírgula no mundo".
Essa sem-cerimônia com as próprias paixões justifica, mas não totalmente, algumas opções do tradutor, que às vezes exagera nos brasileirismos.
É o caso de "Não Vou Chiar", modo excessivamente pedestre que André Vallias encontrou para traduzir "Ich Grolle Nicht". O poema, também musicado por Schumann, é uma violenta descompostura na amante fiel, sob uma camada de fingida indiferença.
É o caso de "Não Vou Chiar", modo excessivamente pedestre que André Vallias encontrou para traduzir "Ich Grolle Nicht". O poema, também musicado por Schumann, é uma violenta descompostura na amante fiel, sob uma camada de fingida indiferença.
O texto, e a música de Schumann, foram traduzidos (sim, a música também pode ser "traduzida" para a linguagem da MPB) com muito mais eficácia e beleza por Arthur Nestrovski, num CD com o cantor Celso Sim. Virou, brasileiramente, "Pra que Chorar".
Mas a prosa de Heine aparece também em grande quantidade, e em traduções agilíssimas, na coletânea "Heine- Hein?" (o título é outra gratuidade criticável) de André Vallias.
Eis um trecho de uma crítica musical de Heine, a respeito do autor de "Giselle", Adolphe Adam (1803-1856). "O sr. Adam, pelo que sei, esteve na Noruega, mas duvido que lá algum feiticeiro (...) lhe tenha ensinado aquela melodia (...) que pode provocar um grande malefício: caso tocada, a natureza inteira entra em comoção, os rochedos e as montanhas começam a dançar, e as casas dançam, e, dentro, as cadeiras dançam; o avô puxa a avó para dançar; o cachorro, a gata; e até o bebê pula do berço e dança."
Essa "unificação geral" das coisas (Lua, flor, estrela, primavera, amor) se alterna, na literatura de Heine, com o princípio da separação, da ironia, da distância.
"Corto minha alma ao meio", diz ele à mulher desalmada. "Assopro-te a metade,/ Te abraço, então seremos/ Corpo e alma de verdade." Dancemos. Graças a esta tradução, a alma de Heine vive de novo.
Texto da orelha de Augusto de Campos para Heine hein? Poeta dos contrários:
Considero este livro um dos mais significativos projetos literários brasileiros dos últimos anos de que tenho conhecimento.
Desnecessário acentuar a importância de Heinrich Heine para a literatura, reconhecido, como é, universalmente — ao lado de Goethe e de Rilke — como um dos maiores poetas de língua alemã de todos os tempos. Não é só o cânone estabelecido que o confirma. Basta dizer que um dos poetas seminais da Modernidade, o norte-americano Ezra Pound, situa-o como urna das "luzes" na sua revisão do passado literário, realçando-lhe a atualidade e chegando a afirmar, em seu característico estilo provocativo, que "depois de Villon pode-se pular tudo até Heine". Pois bem. A obra de Heine — em particular a poética — é escassamente conhecida e difundida entre nós. Das traduções modernas de sua poesia só é possível destacar, em termos de qualidade estética — as que constam da antologia de poemas traduzidos por Décio Pignatari, 31 Poetas 214 poemas: do Rigveda a Apollinaire (Editora da Unicamp) — apenas dez textos breves. "Byroniano, Heine teria superado Byron pela finura e precisão de sua arte poética.", é a opinião de Pignatari.
Assim, HEINE, HEIN? — O título é uma saborosa trouvaille a enfatizar a sensação de novidade que nos traz o livro — ganha dimensões incomuns.Não só pela quantidade do material textual que o tradutor nos oferece — ao todo, 120 poemas de todas as fases de Heine — como ainda pela instigante collage de sua epistolografia e de outros textos seus, que estabelecem um contraponto informativo com a antologia poética proposta.
As traduções de André Valhas têm, além disso, alta qualidade estética. Situam-se no âmbito da difícil arte da tradução poética ou da "transcriação" — expressão cunhada por Haroldo de Campos —, cujo objetivo é constituir, na língua de chegada, poemas que reproduzam o impacto e a criatividade originais. Tal empreitada, além do conhecimento das duas línguas, requer muita expertise na elaboração poética, que — dadas as características do original — tem de lidar com requintados módulos métricos e rímicos, sem perder a espontaneidade da linguagem de Heine, onde se mesclam o sermo nobilis e o coloquial-irônico. O tradutor, afeito ao idioma germânico — tendo vivido na Alemanha de 1987 a 1994 - sai-se, a meu ver, com muito brilho dessa aventura literária.
Não é de hoje que ele vem mostrando sua competência tradutória em versões para o português de textos de Georg Trakl e de outros difíceis autores, como Vielimir Khlébnikov, Óssip Mandelstam e Jules Laforgue. Não faz muito, confirmou o seu virtuosismo traduzindo a última obra de Paul Verlaine — os extravagantes Biblio-Sonetos, publicados no ano passado pelo selo literário Demônio Negro.
Ademais, o autor deu-se ao cuidado de adicionar aos textos um alentado estudo introdutório sobre a obra de Heine, completando-o com um posfácio voltado para a biografia do poeta alemão, que tem um perfil revolucionário e precursor, sob vários aspectos, do ideário moderno. A tudo isso acrescentou, ainda, notas, bibliografia brasileira de Heine e índice analítico-remissivo, visando a facilitar aos nossos leitores o acesso à obra e a informação necessária para a sua contextualização histórica e literária.
Poema de Verlaine traduzido por André Vallias:
Bibliofilia
O livro velho, tantas vezes lido!
Com furos e fissuras ficou feio
Por uso, mas de súbito está cheio
De vida, ao tato e à vista oferecido.
O livro, que até pouco era defunto,
Ressurge "sem surpresa para o sábio"
Que sabe, ó Transformista de alfarrábio,
O quanto de arte pões no teu assunto.
Jovem de novo, afoito para o afã:
O livro – feito antiga cortesã
Que alguma fada-mãe deixasse virgem;
E, como se escutássemos a voz
Dourada de uma excelsa musa, nós
Relemos, entretidos na vertigem.
O livro velho, tantas vezes lido!
Com furos e fissuras ficou feio
Por uso, mas de súbito está cheio
De vida, ao tato e à vista oferecido.
O livro, que até pouco era defunto,
Ressurge "sem surpresa para o sábio"
Que sabe, ó Transformista de alfarrábio,
O quanto de arte pões no teu assunto.
Jovem de novo, afoito para o afã:
O livro – feito antiga cortesã
Que alguma fada-mãe deixasse virgem;
E, como se escutássemos a voz
Dourada de uma excelsa musa, nós
Relemos, entretidos na vertigem.
Bibliophilie
Le vieux livre qu’on a lu, relu tant de fois !
Brisé, navré, navrant, fait hideux par l'usage,
Soudain le voici frais, pimpant, jeune visage
Et fin toucher, délice et des yeux et des doigts.
Ce livre cru bien mort, chose d'ombre et d'effrois,
Sa résurrection « ne surprend pas le sage ».
Qui sait, ô Relieur, artiste ensemble et mage,
Combien tu fais encore mieux que tu ne dois.
On le reprend, ce livre en sa toute jeunesse,
Comme l’on reprendrait une ancienne maîtresse
Que quelque fée aurait revirginée au point;
On le relit comme on écouterait la Muse
D'antan, voix d'or qu'éraillait l'âge qui nous point :
Claire à nouveau, la revoici qui nous amuse.
VERLAINE, Paul. Biblio-Sonetos. Tradução de André Vallias. São Paulo: Selo Demônio Negro, 2010.
Le vieux livre qu’on a lu, relu tant de fois !
Brisé, navré, navrant, fait hideux par l'usage,
Soudain le voici frais, pimpant, jeune visage
Et fin toucher, délice et des yeux et des doigts.
Ce livre cru bien mort, chose d'ombre et d'effrois,
Sa résurrection « ne surprend pas le sage ».
Qui sait, ô Relieur, artiste ensemble et mage,
Combien tu fais encore mieux que tu ne dois.
On le reprend, ce livre en sa toute jeunesse,
Comme l’on reprendrait une ancienne maîtresse
Que quelque fée aurait revirginée au point;
On le relit comme on écouterait la Muse
D'antan, voix d'or qu'éraillait l'âge qui nous point :
Claire à nouveau, la revoici qui nous amuse.
VERLAINE, Paul. Biblio-Sonetos. Tradução de André Vallias. São Paulo: Selo Demônio Negro, 2010.
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